Na última semana, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a principal da Casa, voltou a analisar uma PEC (3/2022) aprovada pela Câmara dos Deputados que pode privatizar áreas da União no litoral, transferindo a propriedade dos terrenos do litoral brasileiro do domínio da Marinha para estados, municípios e proprietários privados. Especialistas apontaram que o texto abre brechas na lei para criar praias privadas, além dos altos riscos ambientais. O texto acaba com a taxa de 5% paga à União, o chamado laudêmio, paga sempre que um imóvel considerado “de marinha” é vendido de uma pessoa para outra. Embora esses imóveis sejam ocupados e comercializados por particulares, a propriedade formal é da União.
O relator, senador Flávio Bolsonaro, do PL do Rio de Janeiro, atua para aprovar o projeto. Como teve o aval da Câmara, o texto vai à promulgação caso seja endossado pelo plenário do Senado. O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) defendeu algumas vezes durante seu mandato a transformação de Angra dos Reis (RJ) em uma “Cancún brasileira”. A comparação insinuava que faltava ao Brasil a permissão para resorts e hotéis gigantes se instalarem em praias. Durante o governo, as falas foram ficando mais diretas.
O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou, nesta segunda-feira (03/06), que o governo é contra a proposta que permite a privatização de áreas de acesso às praias brasileiras e vai trabalhar para suprimir esse trecho no projeto que tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. “Do jeito que está a proposta, o governo é contrário a ela”, disse, após reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Palácio do Planalto. O Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI) se posicionou contra a proposta. Segundo o ministério, a aprovação da PEC traria diversos riscos, como especulação imobiliária, impactos ambientais descontrolados, perda de receitas para a União e insegurança jurídica.
A gestão do litoral brasileiro é definida por uma lei de 1988, publicada às vésperas da promulgação da Constituição. O texto estabelece que “as praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas”. Aprovada, o governo terá dois anos para fazer a transferência de propriedades, os defensores do projeto dizem que ele dá mais segurança jurídica aos donos de mais de meio milhão de imóveis no Brasil.
A proposta resgata um debate público preconceituoso de afastamento das populações menos favorecidas, principalmente periféricas às praias, como mostra as polêmicas falas de entrevistados do documentário “Os pobres vão à praia” da Rede Manchete de 1989, reprisado atualmente nas redes sociais por se encaixar com tema, que reforça a ideia de que as praias sejam de poucos. Além de prejudicar várias comunidades pesqueiras e potencializar possíveis deslocamentos de comunidades quilombolas e indígenas contra essas regiões litorâneas.
Em toda a costa brasileira há uma faixa de 33 metros que vai do mar ao continente chamada terrenos de marinha, essa área pertence à União. As casas ali construídas são compartilhadas percentualmente entre o dono do imóvel e o governo. Por isso, quem mora nesses locais precisa pagar anualmente duas taxas à União, o foro e o laudêmio. A entrega dessas áreas protegidas ao capital privado não apenas ameaça o acesso público às praias, mas também intensifica a exploração e degradação ambiental. Sob o capitalismo, o lucro prevalece sobre a preservação, e desastres ambientais se tornam mais frequentes. Já que isso põe em risco a adaptação da população às mudanças climáticas, segurança nacional e a economia das comunidades costeiras. Terrenos de Marinha protegem e são guardiões naturais contra enchentes, deslizamentos e eventos climáticos extremos. Em algumas cidades litorâneas como por exemplo Balneário Camboriú, Itajaí, Navegantes e etc, milhares de imóveis estão nessas áreas.
Beneficiados da pec 03/2022
As redes sociais se tornaram palco de alfinetadas entre Neymar e Luana Piovani após ela se posicionar contra Neymar, o qual se beneficiará da Pec 03/2022. Neymar (Neymar Sport) é sócio da incorporada pernambucana Due. Juntos anunciaram a criação da “Rota Due Caribe Brasileiro”, um projeto turístico que compreenderá 28 empreendimentos imobiliários de alto padrão numa região de cerca de 100 quilômetros entre os estados de Alagoas e Pernambuco. A ideia é que todo o projeto esteja pronto até 2037, com faturamento estimado de 7,5 bilhões de reais. Os investidores querem assim criar um Caribe Brasileiro no Nordeste.
Após o cantor Oruam (de origem pobre e de periferia) se posicionar em apoio a Neymar, internautas criticaram o MC devido a incoerência entre a grande parte do público jovem dele ser de periferia e o mesmo público ter nas praias cariocas uma forma de acesso ao lazer gratuito.
Participe da consulta pública no site oficial do governo. Até o momento, ela está com mais de 150 mil votos contra a proposta de emenda à Constituição(3/2022), em contraste com 2 mil votos a favor.
https://www12.senado.leg.br/ecidadania/visualizacaomateria?id=151923
Proposta de emenda à Constituição (3/2022)
https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9074749&disposition=inline
Pedro Vinícius Lobo
Jornalista