No histórico do judiciário brasileiro nunca foi indicado uma mulher negra para este cargo, uma das fotografias que marcou o cenário político, midiático, artístico e acadêmico foi estendida na Rocinha, considerada segunda maior favela do Brasil, segundo o Censo de 2022.
Tudo começou com a pressão da sociedade ao Presidente da República Lula em indicar um novo nome para atuação no STF (Supremo Tribunal Federal) e também com a saída de Rosa Weber, ministra em atuação desde 2011. Em nosso país já tivemos participações femininas (Ellen Gracie Northfleet (2000-2011); Cármen Lúcia Antunes Rocha (2006 – ainda está em exercício) e Rosa Weber que já se aposentou. Todas elas brancas, mas nenhuma negra.
Em setembro, não se falou de outra coisa a não ser um assunto. Faixas foram estendidas no dia (24) com o slogan – Ministra Negra no STF (Supremo Tribunal Federal) em várias localidades e favelas no Rio de Janeiro.
A ideia iniciou com o movimento MND (Mulheres Negras Decidem), uma organização que se preocupa em pensar os impasses sofridos por mulheres negras, no fazer político e o bem viver das mesmas em cenários políticos e territoriais.
Magda Gomes é engenheira civil de formação, há 10 anos se empenha em pensar no arranjo político de mulheres negras. Hoje, ela é coordenadora política da Rocinha, conselheira e mobilizadora do MND.
Em entrevista, ela nos conta como surgiu a ideia da campanha e os impactos causados a nível nacional e internacional.
“Nós dissemos para o fotógrafo: “Tá a fim de fazer uma foto histórica? Queremos uma fotografia espontânea, que chamasse a atenção de autoridades brasileiras, mas que também traga uma mobilização nacional e uma reflexão, queremos mudar a história deste país.”
Ela ainda detalha sobre os impactos nas favelas.
“Nosso objetivo era tocar no imaginário do morador e da moradora, queríamos que a faixa fosse estendida por mãos negras. Recebemos muitos comentários. As pessoas não sabiam que existia o STF e que o espaço permitia a participação de mulheres.”
A faixa na favela
Manguinhos é uma favela localizada na Zona norte do Rio de Janeiro. Por lá, eles também receberam uma faixa que foi recebida por Jéssica Lene.
Jéssica é moradora de Manguinhos, estudante de pedagogia, articuladora e comunicadora do Jornal Comunitário Fala Manguinhos.
Para ela, “As mulheres negras precisam ocupar os cargos de liderança, visto que estas foram colocadas em papéis de subalternidade. Foram submetidas a processos de exclusão e escravidão. É necessário que o Brasil escute as Marias, Marielles e Mallês, Por muito tempo organizamos as cozinhas”.
A realidade das favelas cariocas é outra, por isso, a ideia de que haja uma ministra negra é também fruto do resgate de reparação histórica em que tanto a população afro-brasileira busca em sociedade, nada mais é do que a luta por igualdade racial.
É preciso pontuar que hoje existe o MIR (Ministério da Igualdade Racial) que também se preocupa na construção de um país com memória, justiça, respeito e igualdade.
Jéssica também fala da atuação desta ministra e dos comprometimentos que permeiam esta posição, bem como a responsabilidade que o coletivo precisará ter.
“Entendo que o judiciário foi pensado para promoção e aniquilação de corpos negros, é uma disputa de narrativa, é uma disputa institucional, é fundamental que a sociedade esteja envolvida nesta discussão. Precisamos de uma mulher negra no STF para quebrar paradigmas e institucionar as pautas referente a população negra. Precisamos estar prontos e prontas para ocupar esse cargo, junto com esta jurista negra”.
As estatísticas não mentem!
Ainda são poucas as informações encontradas no site do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Existe uma disparidade alarmante no que se refere as questões de raça e gênero na atuação judiciária brasileira, por isso, trazemos aqui alguns dados que apontam que a questão é também sobre as desigualdades nas diversas áreas de atuação do poder.
Os dados fornecidos aqui, pelo Portal Favelas foram encontramos no Estudo-Relatório “Retratos de Poder: Mulheres Negras pela Transformação do Poder Judiciário.” criado por Mulheres Negras Decidem e campanha Ministra Negra Já em 2023.
Em setembro, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou o diagnóstico Étnico-Racial do Poder Judiciário. Captamos algumas informações referente as informações sobre a atuação de cargos no quesito raça/cor de acordo com a padronagem do IBGE.
Em 2023, constatou-se que: 7,1% das ministras/conselheiras são negras, comparando a 92,9% de ministras/conselheiras brancas. Já 12,7% ministros/conselheiros negros para 87,3% ministros/conselheiros brancos.
Beatriz Pimentel
Jornalista